quinta-feira, 22 de setembro de 2016

PROJÉTIL #0

Depois de um longo período de abandono deste blog, estou atualizando com um fanzine que preparei, que se chama Projétil e não é por nada, a idéia é algo curto e cortante como um tiro, talvez pegando de raspão, ou aquele zunido do lado da orelha, ou o buraco na parede que ninguém nota quando passa (mas que eu disparei, eu disparei!), fugindo um pouco do famigerado textão (que na verdade eu acho uma alcunha meio idiota pra... textos). O Projétil #0 foi feito especialmente pro último PAIN (Porto Alegre Indie Games), encontro das pessoas que fazem joguinhos de computador nas redondezas. Sim, também acho o nome enfadonho, não sei por que esse fetiche por siglas que formam palavras em inglês. Mas é o que temos, galera!

Gostaria que o indie local (não só o local, mas falo daqui porque é onde estou) fosse menos aburguesado - e aos colegas locais que estão lendo, não levem este termo pra além do que ele meramente significa: muita preocupação com inserção no mercado e demasiado apreço pela etiqueta. Em outras palavras: independente por uma questão de circunstância, não de princípios. Acho que essa é uma limitação da cena e também um elemento que a condena a desaparecer: afinal, se a gente deixar de ser independente, vai considerar esse acontecimento um sucesso. E aí? Acabou a cena! Quem vão ser os veteranos a tocar a cultura e fazer o elo com as gerações posteriores? Teremos que esperar um novo arroubo de paixão, daqui a 10 ou 20 anos, de jovens pesquisadores entusiasmados com a longínqua história dos antigos indies que se tornaram poderosos em suas garagens yuppies. Tentando repetir o feito heróico, estarão mais uma vez condenando sua cena ao desaparecimento por desejarem o fim. O potencial revolucionário de uma provável cena de videogame popular acaba se desmanchando como possibilidade logo nos primeiros anseios de seus participantes.

É com preocupação séria mas fraterna que falo aos colegas: não vamos conquistar nada duradouro desse jeito. Ou pelo menos nada culturalmente significativo. Podemos ganhar dinheiro, quem sabe. Mas sobre o dinheiro, há uma verdade triste: dos que fazem a cena acontecer, poucos são os que vão ganhar algum. Isso produz inveja, produz ressentimento... nada saudável pra sobrevivência de uma coletividade.

Talvez alguns tenham sonhos simples: trabalhar fazendo fragmentos de videogame em algum escritório, pra se sustentar mesmo. Tudo bem, a gente precisa se sustentar afinal de contas. Mas não sei, isso não parece independente. Não parece ser o sonho que cria uma cena. Me pergunto se partindo disso seria mesmo possível que surjam os tais heróis que os jovens do futuro vão pesquisar e imitar. Talvez a gente desapareça dessa vez e aí desapareça mesmo! Puf! Não sobra nem a narrativa.

Ninguém precisa ser herói, nem é bom querer isso, porque herói é uma coisa morta que só aparece nas histórias e bustos de pedra. A cena não deve ser heróica, vitoriosa, um movimento ascendente que conquista a glória dos heróis mortos, sepultados em seus retratos desonestos. Muito menos mártir, que não conseguiu nem a glória direito e só justifica a imagem benfazeja porque o inimigo era mais filho da puta. Ficar sofrendo de propósito pra virar mártir ninguém merece - o risco de ninguém dar a mínima pro seu sofrimento é bem grande. Contar e ouvir histórias de pessoas que nos encorajam e ensinam coisas é bom, fazer da própria vida um ensaio de biografia póstuma é desperdício. Quem sabe a gente só precisa mudar o jeito de se sustentar, pra não precisar fazer o que gosta de um jeito que nos deixa desgostosos, ou fazer o que não gosta o dia inteiro e aí não ter tempo de gostar de viver. Não é simples, mas sei lá.

Era só pra postar o fanzine, mas acho que escrevi um pouco mais do que planejei. Bom, espero que eu não abandone isso aqui por muito mais tempo. Se alguém quiser uma cópia impressa do fanzine e for de Porto Alegre ou estiver passando, dá um grito aí nos comentários.









19 comentários:

  1. Sempre dou uma passada pra conferir se tem novidades, mas depois desse tempo todo meio que virou um hábito acessar o blog (em uma sequência de sites que costumo acompanhar no cotidiano) e sair logo em seguida por ter nada recente.

    Hoje bateu aquele "ué" quando de relance notei algo que não a tela título do joguinho do Bart, tive que voltar a página pra confirmar se era algo novo mesmo.

    Enfim, sei que não era sua intenção tratar algo além da divulgação da fanzine, mas como falou ali sobre aquela questão do ganho financeiro eu queria apenas deixar um breve relato.

    Hoje se tu for lá na página do Steam Greenlight verá que tem rencas de jogos de qualidade p*** questionável, e não me refiro ao nível de profissionalismo dos assets mas sim a quase ou total ausência de conteúdo.

    Aquela icônica frase que o Henrique da BRMaker citou certa vez - "bolinha vermelha e o matinho verde" - creio que ilustra perfeitamente o cenário em questão. A própria mecânica de aceite do Greenlight dá o ensejo pra que um autor que possui uma boa rede de amigos/contatos emplaque o projeto na loja sem a menor dificuldade.

    Por um lado podemos dizer que isso é bom, afinal existe uma oportunidade real de qualquer pessoa, do profissional ao leigo, chegar com seu trabalho e conquistar espaço pra comercializá-lo. O problema no entanto é que esse levante de joguinhos genéricos acabou se tornando um verdadeiro nicho.

    OK, o público dessas plataformas de vendas já é alienado pela indústria, então há nada de estranho neles consumirem as "modinhas", mas como fica aquele cara que quer produzir videogame tradicional e inteligente?

    Fico imaginando aqui, por exemplo, qual seria a recepção de um Macaco Grande (que é de longe muito superior ao que promovem por "retro" lá)... é bem capaz de não gostarem por não ter conquistas online ou efeitos de shader!

    Acho importante ressaltar que existe uma grande diferença entre produzir jogos independentes e se intitular dev indie da mesma forma como jogar videogame virou "ser gamer". Como tu diz no texto, é uma questão de princípios, não uma mera classificação por modus operandi.

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    1. Eu trato muito mal o meu blog, essa é a verdade.

      Sobre o lance do indie e a abertura do Greenlight: é fato que o mainstream conseguiu transformar o indie numa categoria com características mais ou menos padronizadas como, por exemplo: ter sempre elementos que remetem ao retrô. Por que tantos jogos saem ruins? Porque nem todos os desenvolvedores possuem o acúmulo ou repertório retrô. Não entenderam o que, na essência, constitui um videogame tradicional. Revestem uma estrutura frágil e senso comum com alguma superfície old school, alguma levada visual ou sonora. Se o independente fosse compreendido não como um nicho para consumidores de determinados trejeitos, mas como um movimento com princípios... provavelmente teríamos uma quantidade maior de jogos honestos, ou seja, que não buscam o nicho mas são frutos de uma escola (escola aqui no sentido de estilo, maneira ou tradição - algo mais da estrutura e da construção que das tags que se atribui ao produto).

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    2. Não acompanho redes sociais mas sei que tu costuma postar coisas no Twitter e no Facebook, além daqui.
      O problema é que fica tudo muito "solto", digo, cada um desses canais contém atualizações sortidas e aparentemente sem um padrão, mais ou menos como uma saga em quadrinhos que tu tem de comprar títulos que não curte pra poder prosseguir no enredo.
      Talvez se concentrasse as publicações aqui e usasse os botões de compartilhamento do Blogger pra linkar nas redes sociais, nenhum canal teu seria desfavorecido/etc.

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  2. Mas ai é que esta, a popularização do game, em espaços de desenvolvimento. a greenlight é mercado, estive pensando muito sobre as questões do videogame, em geral como já ensaio PP, "o videogame de direita, conservador" e acho q tem mesmo q rolar um contra ponto, estou a um tempo tentando imaginar outras formas de explorar essa cultura do videogame meio marginal, me calha de sempre empatar entre o seríssimo (videogame exageradamente intelectual) e o absurdo (videogame exageradamente surreal), falando serio, acho q Paiva é um dos caras q mais traduzem a questão cultural e artística dos games.

    estive pensamento muito em forçar mais uma cena em SP, mas aqui realmente o indieDev esta galgando um mercado, uma fatia do bolo, q é o q estou principalmente fugindo, acho q, qualquer jogo q eu venha a fazer no mínimo, vai quebrar umas leis de direito autoral, quem sabe num futuro próximo não fundamos os utópicos fliperamas.

    Abrçs

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    1. Os fliperamas são o futuro! A questão é: como fazer com que o fliperama também fuja da gourmetização geek? Não prestaria ressuscitar o fliperama, que tem uma história muito rica de consumo popular no Brasil, pra simplesmente gentrificar a sua memória.

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    2. Acho que antes até de pensar no fliperama deveria ser levado em conta uma produção mais consistente.
      Apenas pra citar um exemplo, dos últimos 2 ou 3 projetos teus que tive notícias, nenhum se concretizou.
      OK, ninguém aqui espera assumir uma rotina de trabalho, não é assim que o "indie por princípios" funciona, mas tu não pode ter um movimento sem o objeto a que ele se propõe.
      Não sei se conhece a ferramenta PICO-8 (http://www.lexaloffle.com/pico-8.php), mas é bem interessante ver como aquilo gerou uma pequena comunidade de desenvolvedores que estão produzindo bastante material (vide a aba Cartridges).
      A simplicidade e limitação acabam estimulando a criatividade, como pode ser visto em algumas releituras bacanas de clássicos que tu pensa não ser mais possível diversificar.

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    3. Não sei se um fliperama precisa esperar que a produção independente local atinja um nível ideal de maturidade ou consistência.

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    4. A curto prazo talvez não, mas o ponto chave é o que tu diz lá no texto sobre o risco do movimento tornar-se auto extinguível.
      Vejo uma situação semelhante ocorrendo com as comunidades de suporte. Anos atrás tu tinha por exemplo a BR Maker com determinado número de pessoas explorando o desenvolvimento amador, e isto atraía outras pessoas para o meio (eu me incluo).
      Já hoje, os poucos fóruns (nacionais) ainda online sobrevivem da curiosidade de um ou outro leigo que sonha publicar seu projetinho no Steam e ganhar muito dinheiro.
      De certa forma acho que podemos dizer que o game dev "se popularizou" um pouco tarde no Brasil, até pelas questões socio-econômicas não tão adequadas como nos países ricos.
      Ao mesmo tempo que surgiram as ferramentas acessíveis que temos hoje, o indie amador já estava sendo associado à aquela estética do pixel art minimalista com shaders.
      O que estou tentando dizer é: como esse movimento irá resgatar os princípios do desenvolvimento independente se ele próprio é menos maduro que a visão "dominante" que se tem do indie no momento.

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    5. muito legal a referencia, também participei um bocado de forums, e realmente a maioria esta inativa.
      mas acho que faz parte da dialética da modernidade, da rápida mudança das coisas, acho que temos que arriscar e forçar talvez a criação de uma cena mesmo que dentro da internet, para inspirar ou organizar possíveis fliperamas, bom isso é o que, eu penso, um pensamento ainda ingênuo tenho que admitir.

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    6. Em certa ocasião (não me recordo exatamente qual) eu havia comentado com o Pedro aqui no blog sobre essa questão da cena "local e presencial" ser relativamente restritiva.
      Amenos que tu venha a ter contato com pessoas que já estão envolvidas, dificilmente irá se deparar com essas atividades através da Internet (o próprio perfil desse pessoal não é o de frequentar comunidades de suporte, por exemplo).
      Sou de SP e até hoje desconheço a existência de algum grupo que se dedique à essa finalidade por aqui. Se há, a atuação e principalmente o alcance dos trabalhos deve ser completamente limitado ao próprio círculo de amizades e etc.
      Se tu implanta um fliperama nesse contexto eu sinceramente não vejo como pode vir a produzir "sucessores". É mais ou menos como aqueles negócios familiares que tentam se manter apenas dentre pessoas diretamente ligadas e acabam desaparecendo após a 2° ou 3° geração.
      Anos atrás tínhamos o que poderia ser uma representação funcional do que tu diz com "cena dentro da Internet", um fórum chamado Cérebro que reunia desenvolvedores amadores mais preocupados com a arte no videogame do que a questão de venda/lucro e afins.
      Bom, pra dizer a verdade nem todos lá demonstravam um alinhamento com essa filosofia e acabou por ser encerrado quando tentaram mudar esse propósito pra algo mais profissional.
      Enfim, penso que seria interessante a formação de uma "cena online" que funcionasse como um agregador de pessoas e até mesmo como um espaço para democratização de conteúdo (artistas interagindo com programadores e vice-versa).

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    7. Eu acho que essa parte "local e presencial" de uma comunidade (que se amplia no online) precisa também de uma parte de ensino. Cursos, seminários, oficinas... isso tem potencial pra agregar pessoas novas e passar adiante a tradição do fazer. Porque agregar apenas jogadores eu acho fraco, não é diferente do fliperama clássico onde as pessoas iam só pra jogar.

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    8. Bem lembrado, Pedro. O problema é que o fator "presencial" acaba se tornando algo proibitivo, digo, muita gente (eu mesmo) não tem condições (leia-se disponibilidade, espaço, etc.) para promover um(a) curso/oficina fora do ambiente virtual.
      Eu não teria problema algum em criar uma apostila de introdução à Lógica de Programação e posteriormente alguns tutoriais de introdução ao Game Maker, desde que houvesse um espaço online para tal (lembrando que quando falo em "espaço" me refiro à algo voltado exclusivamente para o público do ""Indie por princípios"" (na falta de um termo melhor)).
      É este tipo de interação que eu abordei no comentário anterior, já que mesmo eu, Fábio, não podendo participar presencialmente, ainda possuo uma bagagem que pode ser passada adiante dentro da premissa do movimento.
      Por outro lado eu também me beneficiaria desta troca de experiências, principalmente pela questão motivacional (é muito simples ir em uma comunidade de suporte qualquer e fazer o mesmo, mas é praticamente um desperdício de tempo livre uma vez que aquelas pessoas buscam pelo sonho de publicar no Steam e nada se importam com o restante).

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    9. concordo com o Fábio, os fatores limitantes demandariam talvez até um organização de base anterior ao fliperama apenas pra manter ele de pé, uma casa de cultura em apoio direto ou casa anarquista, acho que o que pode ser feito de imediato é um grupo online com o intuito de criar a rede onde os programadores se encontram com os artistas etc, onde podem ser criados tutoriais e descomplicar o metodo de fazer, por exemplo eu tenho vontade de fazer jogos do 0 mas não entendo nada de programação, apenas de arte, acho que a internet é o lugar mais propicio para a aglomeração de pessoas que vai dar origem aos vários tipos de "games" que vão sair.

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    10. Vale ressaltar também que a formação e manutenção desse grupo online teria nenhum custo, tanto para quem organiza quanto para quem participa.
      Existem diversas plataformas de fórum gratuitas e que demandam um simples cadastro de poucos minutos. A própria comunidade Cérebro que citei anteriormente rodava em um Zetaboard, sem qualquer perfumaria (o que era muito bom já que os membros concentravam-se nos debates e/ou aprendizado).
      Enfim, é uma possibilidade "real" e depende apenas da simples ação de contatar as pessoas que já se encontram envolvidas de alguma maneira com o movimento (ou tentativa de).
      Infelizmente no momento não disponho de amigos/etc. alinhados com a filosofia do "Indie por princípios" para convidar, posso apenas oferecer minha colaboração pessoal.

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    11. to com vc nessa fabio, achar gente assim é difícil, mas acho uma boa começar, até porque vai saber se não tem mais gente tendo essa conversa e achando q esta só.

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    12. Então Nico, esta não é a primeira oportunidade onde manifesto interesse em agregar um grupo online.
      No entanto, no passado o assunto sempre acabou morrendo sem que houvesse alguma definição.
      Não desejo abusar deste espaço de comunicação do blog, mas acredito que o Pedro é quem possui melhores condições de pleitear a ideia junto à outros desenvolvedores/etc (levando em conta que ele já possui um extenso histórico nesse meio).
      Entendo que a mera realização do proposto não acarreta a necessidade de algum tipo de "confirmação" quanto ao interesse de outros colaboradores, mas penso que se não houver um mínimo de apoio o grupo será tão ou mais fraco que reunir apenas jogadores (como o Pedro havia citado acima).

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